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Justiça declara ilegitimidade de sindicato para questionar cargos de confiança bancário e a jornada laboral de oito horas diárias

A 3ª Vara do Trabalho de Pelotas reconheceu que pedidos correspondentes à configuração ou desconfiguração de cargos de confiança se inserem no âmbito dos direitos individuais heterogêneos, não sendo passíveis de serem requeridos em ações coletivas.

A sentença foi proferida em ação trabalhista coletiva movida por sindicato em face de instituição financeira que possui agências bancárias no município do Estado do Rio Grande do Sul, sob a alegação de que o banco não estaria adimplindo com as horas extras devidas aos seus empregados.

Isso porque, segundo o sindicato autor, os empregados ocupantes dos cargos de “Gerente de Relacionamento Pessoa Física, Gerente de Relacionamento Pessoa Jurídica, Assistente Comercial, Coordenador de Atendimento, Gerente de Atendimento, Gerente de Recuperação de Crédito e Gerente de Negócios Reestruturador de Créditos” nas agências do banco réu estariam exercendo serviços meramente burocráticos e administrativos, sem poderes de mando ou gestão, não enquadrando-se, pois, na exceção do § 2º do art. 224 da CLT.

Assim, invocando o princípio da “primazia da realidade”, postulou a destituição da função de confiança de tais cargos, com a consequente limitação da jornada a seis horas diárias, conforme o art. 224, caput da CLT, bem como o pagamento de duas horas extras diárias pelo banco em favor dos representados.

Além disso, alegou o ajuizamento de protesto interruptivo de prescrição sobre sua pretensão, em 8 de novembro de 2012, a fim de evitar “eventual prescrição a ser arguida ou aplicada pelo juízo” com relação à ação proposta em 6 de novembro de 2017.

Dessa forma, requereu:

  • fosse considerado como marco interruptivo da prescrição o dia 08/11/2012 (data em que ajuizado o protesto interruptivo da prescrição pelo sindicato da categoria), em caso de ser aplicada eventual prescrição;
  • a declaração de jornada de trabalho limitada à seis horas diárias para os cargos de “Gerente de Relacionamento Pessoa Física, Gerente de Relacionamento Pessoa Jurídica, Assistente Comercial, Coordenador de Atendimento, Gerente de Atendimento, Gerente de Recuperação de Crédito e Gerente de Negócios Reestruturador de Créditos” das agências do banco réu em Pelotas e região;
  • o pagamento de duas horas extras diárias de trabalho em favor dos ocupantes do cargo em questão;
  • o cálculo das horas extras pleiteadas com base no total da remuneração dos trabalhadores;
  • a integração das horas extras pleiteadas na remuneração dos trabalhadores para cálculo do repouso semanal remunerado (incluindo sábados, domingos e feriados) e seus reflexos em férias acrescidas de terço constitucional, 13º salário, gratificação semestral, FGTS e INSS;
  • a incidência das horas extras sobre aviso prévio indenizado e FGTS, em caso de rescisão de contrato de algum trabalhador;
  • o pagamento de honorários assistenciais pela empresa ré no montante de 15% sobre o valor total da condenação;
  • a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.
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Em sua defesa, a instituição financeira ressaltou a ilegitimidade ativa do sindicato para postular tais pedidos na qualidade de substituto processual dos empregados, em razão de não tratar-se de direito individual homogêneo.

Apontou, conforme o entendimento da Súmula 102, I, do TST, que a configuração ou desconfiguração de cargo de confiança depende de prova das reais atribuições do empregado, ou seja, da verificação da atividade específica de cada gerente, caracterizando-se, portanto, como interesse individual heterogêneo, que demanda solução em processo individual.

Isto é, a verificação de eventual existência de jornada extraordinária para “Gerentes de relacionamento Pessoa Física e Gerentes de relacionamento Pessoa Jurídica”, somente pode ser dirimida pelo Judiciário de forma individual, atento às circunstâncias do caso concreto, apontando o descabimento da ação coletiva e a impertinência de uma sentença genérica a presente situação.

Além disso, esclareceu que, conforme o disposto no § 2º do art. 224 da CLT, os ocupantes de cargo gerencial da agência em questão detêm poderes e responsabilidades diferenciadas dos bancários dos cargos de base, além de receberem gratificação de função superior a um terço do salário – requisitos legais para a aplicação do regime do art. 224, §2º, da CLT e que restaram perfeitamente preenchidos.

Ressaltou também que o protesto interruptivo de prescrição alegado pelo sindicato não teria o condão de afastar a prescrição da pretensão, uma vez que, nos termos do art. 7º, XXIX, da Constituição Federal e do art. 11 da CLT, a interrupção da prescrição somente ocorre com o ajuizamento de reclamação trabalhista em até dois anos, tendo-se passado quase cinco anos entre o ajuizamento do protesto e da ação coletiva em questão.

Assim, requereu, em síntese:

  • fossem acolhidas as questões preliminares, para que o processo fosse extinto sem resolução de mérito (art. 485, IV e VI, do CPC);
  • no mérito, acaso fossem superadas as preliminares, que a ação fosse julgada improcedente, tendo em vista que os cargos de “Gerente de Relacionamento Especial, Gerente de Relacionamento Empresa (atuais denominações para os cargos de Gerente de Relacionamento Pessoa Física e Jurídica, respectivamente), Assistente Comercial, Gerente de Atendimento, Coordenador de Atendimento, Gerente de Recuperação de Crédito e Gerente de Negócios Reestruturados de Crédito” se enquadram na exceção do § 2º do art. 224 da CLT.
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Em sentença, o juízo de 1º grau acolheu os argumentos da instituição ré, considerando que a reclamação postulada pelo sindicato autor enquadra-se no âmbito dos direitos individuais heterogêneos, que dependem da análise de prova específica e particular com relação aos substituídos.

Salientou que, conquanto esteja facultado aos sindicatos o poder de representar sua categoria profissional, nos termos do artigo 8º, III, da Constituição Federal, esta representação não é irrestrita, mas obedece aos limites da lei. E, conforme o art. 842 da CLT, é permitida a cumulação de ações quando idênticas, o que, no entanto, não ocorre neste caso.

Observou que, conforme as provas orais produzidas, há divergências acerca das atividades desempenhadas pelos empregados ocupantes dos cargos em questão, assentando que a verificação da configuração ou desconfiguração do cargo de confiança dependeria da avaliação da situação fática de cada substituído.

Destacou, ainda, que ao se processar a presente ação como coletiva ou como individual plúrima, sob o risco de limitar o direito do banco, seria necessário ouvir o depoimento de várias testemunhas, o que subverteria todo o princípio do processo coletivo, que tem por base a facilitação do acesso à justiça e não o seu embaraço.

Diante disso, concluiu ser o sindicato autor parte ilegítima para postular tais pedidos e julgou a ação coletiva extinta, sem resolução do mérito, concedendo o benefício da gratuidade judiciária ao sindicato autor.

Em face da sentença, houve a interposição de recurso ordinário pelo sindicato autor, bem como de recurso adesivo pelo banco, que aguardam julgamento.

Para saber mais, confira a íntegra da decisão.

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