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TJSP anula processo em que juiz converteu pedido de alvará judicial em cumprimento de sentença (sem sentença)

O processo em comento se iniciou (pela via da jurisdição voluntária) com um pedido de herdeiros (viúva e filhos) para que lhes fosse concedido alvará judicial para a transferência de ações de empresas de telefonia (Brasil Telecom, Telesp, TIM, TeleNorte, Telemig e Telebrás) que o autor da herança detinha e cuja escrituração seria mantida em determinada instituição bancária. 

Intimado a realizar a transferência dessas ações, o banco esclareceu, ainda em 23.03.2012, que a custódia das ações havia sido transferida para outras instituições bancárias, , e orientou os requerentes que dirigissem a sua pretensão contra as instituições que passaram a custodiar as referidas ações.  

Apesar dessa orientação, os herdeiros passaram a deduzir suposto descumprimento, por parte do banco, da ordem de transferência;  pediram, assim, que ele (banco) fosse condenado a pagar o valor das ações. Esse pedido foi acolhido pelo Magistrado de 1º grau, que converteu o pedido de alvará judicial em um “cumprimento de sentença” (mesmo sem qualquer sentença) e determinou que o banco pagasse, em 15 dias, a importância apontada pelos autores, sob pena de serem acrescidos multa e honorários ao valor em questão. 

A instituição financeira se viu obrigada a depositar o valor integral pretendido pelos requerentes e a “impugnar” aquele cumprimento de sentença, oportunidade em que defendeu a inexigibilidade do “título executivo” e o excesso de execução, em 19.05.2009. 

Em paralelo, o banco também recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo contra a decisão que lhe havia fixado multa por descumprimento da ordem de transferência das ações e o seu recurso foi provido, para limitar a sua obrigação ao pagamento de uma multa no montante de 20% do valor das ações aos autores. 

Com isso, restava apurar o valor das ações, o que o Juiz de 1º grau determinou que a Perícia Judicial fizesse, na data base 23.03.2012, data em que se fixou o suposto descumprimento da ordem de transferência.  

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Ocorre que o Perito Judicial apurou – sem qualquer impugnação das partes – o valor das ações, na data em que se tem por descumprida a ordem de transferência expedida ao banco, e, com isso, a “impugnação” ao cumprimento de sentença oferecida por ele  foi acolhida, porque se constatou, de forma técnica, o excesso de execução por ele defendido. 

Extinto, por sentença, o processo em questão, com fundamento no artigo 924, inciso III, do CPC, os requerentes apelaram e pediram que fosse restabelecida a multa diária que já havia sido revogada no julgamento anterior do TJSP.  

Em resposta, a instituição financeira, em caráter preliminar, defendeu a nulidade do processo em questão, em razão da conversão de um pedido de jurisdição voluntária (alvará judicial) em um cumprimento de sentença (sem sentença) que o condenou a pagar valores que nunca foram pedidos pelos autores. Em caráter subsidiário, pediu que fosse mantida a sentença de extinção, pois acolheu as conclusões técnicas da prova pericial contábil – que não foram impugnadas por nenhuma das partes. 

Ao julgar a apelação dos autores, o TJSP acolheu a preliminar deduzida pelo banco e anulou todo o processo, por entender que o pedido de alvará judicial era totalmente incompatível com a conversão realizada pelo Juiz de 1ª instância.  

Segundo o acórdão em questão: “o alvará é instrumento, de cunho meramente administrativo, outorgado pelo juízo, em âmbito de jurisdição voluntária, com a finalidade de consolidar atos e negócios, por representantes, em substituição à vontade do próprio interessado, em virtude da impossibilidade física de sua manifestação”, circunstância que jamais deveria ter evoluído para uma “execução em face da instituição financeira, em decorrência da sentença prolatada, sem contraditório e defesa da empresa, implicando em falha (“error in procedendo”) maléfica ao cânone constitucional da ubiquidade da justiça, pela marginalização do serviço do Estado de dispor à parte passiva amplo acesso a instrumento útil à cognição exauriente, eventualmente capaz de induzir pormenorizadamente a convicção do julgamento, em desatenção à premissa (“due process of law”) alicerçada nos incisos XXXV, LIV e LV do art. 5º da Constituição Federal”.    

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Decidiu-se, ainda, que o caso não comportava transformação automática do pedido ou fungibilidade das vias processuais, dadas as suas peculiaridades, descabendo faculdade de seleção de forma do instrumento processual. E que, não restando dúvida do erro grosseiro, deveria a parte requerente assumir a responsabilidade, por sua conta e risco, pelas consequências da inadmissibilidade do processo que se anula, devendo ajuizar outro pela via própria e com os pedidos incidentais deduzidos neste.  

Para saber mais, leia a íntegra da decisão.

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