A ação rescisória fundada em prova nova 

28 de janeiro de 2024

Nos termos do art. 966, inciso VII, do Código de Processo Civil, a decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável. 

Trata-se de uma das excepcionais hipóteses previstas em lei que permitem a revisão de decisão de mérito transitada em julgado. Diz-se excepcional porque vigora a proteção constitucional à coisa julgada e ao princípio da segurança jurídica, a consagrar o caráter taxativo do rol de possibilidades de rescisão de decisões de mérito transitadas em julgado. Nesse sentido, o entendimento acerca do não cabimento da ação rescisória para atacar a “justiça” da decisão é sólido nos tribunais. 

À guisa de exemplo, oportuno analisar a ementa de julgado oriundo do Tribunal de Justiça de São Paulo: 

AÇÃO RESCISÓRIA ORIGINÁRIA CONTRA SENTENÇA – Alegação de violação do artigo 966, incisos V, VII e VIII, do Código de Processo Civil/15 – Não há violação de dispositivo de lei quando se pretende a rescisão que apenas decidiu inversamente ao que pretendia a autora – Não cabimento da ação rescisória para atacar a justiça da decisão, para o reexame das provas ou a interpretação dos fatos com base nos quais o juízo formou sua livre convicção – Ação rescisória que não pode ser utilizada como sucedâneo de recurso – Exegese da Súmula nº 343 do Colendo Supremo Tribunal Federal: “Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida” – Sucumbência suportada pela autora – Ação rescisória julgada improcedente. 

(TJ-SP – AR: 21757271220188260000 SP 2175727-12.2018.8.26.0000, Relator: Marcelo L Theodósio, Data de Julgamento: 19/02/2019, 11ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 20/02/2019) 

Tais limitações para o manejo da ação comentada visam coibir e prevenir que se adote a rescisória como medida equiparada a recurso, passível de utilização nas oportunidades que a parte discordar do quanto decidido sob algum aspecto.  

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da ação rescisória n° 5748 ES 2015/0308071-6, sob a relatoria da Ministra Regina Helena Costa, reafirmou que diante de “nítido intuito de rediscutir-se decisão desfavorável, revela-se incabível a Ação Rescisória”. Na mesma oportunidade, o STJ destacou que o entendimento da corte é firme no sentido indicado, assim como o da Suprema Corte. De fato, são diversos os julgados também do Supremo Tribunal Federal que não admitem “propositura de ação rescisória com a finalidade de rediscussão de matéria amplamente debatida na decisão rescindenda” (STF – AR: 2699 RS, Relator: Ricardo Lewandowski, Data de Julgamento: 30/08/2021, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 08/09/2021. Outros julgados da Suprema Corte em igual sentido: AR 1.749 -AgR/BA, Rel. Min. Gilmar Mendes, AR 1.863/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, AR 1.958 -AgR-segundo/MG, Rel. Min. Dias Toffoli e AR 2.398/SC, Rel. Min. Rosa Weber).   

As já restritas hipóteses previstas na norma, rigorosamente observadas pela jurisprudência, ainda podem sofrer limitações, tal como ocorre com o entendimento retratado pela Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal, estabelecendo que: “Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida”. Do mesmo modo, cabe mencionar o posicionamento no sentido de que não é possível asseverar a existência de literal afronta de lei, quando a orientação contida na decisão rescindenda encontra respaldo, inclusive, em precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ – Ação Rescisória nº 5.196 – RJ (2013/0147106-7), rel. Min. Mauro Campbell Marques. Julgada em 14.12.2022). 

O Plenário do Supremo Tribunal Federal também já afirmou que é inadmissível a ação rescisória em situação jurídica na qual a legislação prevê o cabimento de uma ação diversa (AR 2697 AgR/RS, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 21.3.2019), igualmente a restringir a utilização do instituto. 

Noutro prisma, vale pontuar que se admite ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenha esgotado todos os recursos, nos termos da Súmula 514 do Supremo Tribunal Federal.  

A específica circunstância autorizadora da medida aqui tratada, prevista no art. 966, inciso VII, do Código de Processo Civil, representa inovação relevante em relação ao dispositivo equivalente no Código de Processo Civil de 1973, pois o inciso VII do art. 485 exigia que o autor da ação rescisória obtivesse um tipo específico de prova nova a viabilizar o ajuizamento da demanda, devendo obrigatoriamente consistir em prova documental: 

CAPÍTULO IV  

DA AÇÃO RESCISÓRIA  

Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:  

(…)  

 VII – depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de Ihe assegurar pronunciamento favorável; (grifamos) 

O texto atual do inciso em referência alargou as possibilidades, já que agora a previsão é de prova nova, não havendo a limitação no texto de lei que restrinja à hipótese ao documento novo, alargando-se sobremaneira as situações de fato nas quais a norma pode ser invocada, já que vige a admissibilidade da prova atípica produzida nos contornos estabelecidos pelo art. 5º, incisos XXXV, LIV, LV e LVI, da Constituição Federal.  

Conquanto a alteração legislativa tenha solucionado uma das controvérsias atinentes à questão, outras seguem em debate no Poder Judiciário.  

Nesse sentido, há destacada dificuldade quanto ao atendimento da exigência legal no sentido de efetivamente as provas classificadas como novas nas demandas realmente se amoldarem à hipótese autorizada pelo legislador.  

De início, é importante consignar que, para fundamentar a ação rescisória, somente a prova deve ser nova, e não os fatos. Isto porque os fatos retratados pela prova nova devem, obrigatoriamente, consistir em fatos controvertidos considerados na decisão que se pretende rescindir. Assim, não é dado à parte, no bojo da demanda excepcional em referência, inovar acerca de questão cuja controvérsia não existiu na demanda originária.  

Além disso, a circunstância reclama relevância da prova nova de tal modo que está se mostre suficiente para assegurar ao autor da ação rescisória um pronunciamento diverso daquele contido na sentença impugnada, consistente em desfecho que lhe favoreça.  

O termo “prova nova” deve ser entendido como prova anteriormente existente, mas cujo acesso pela parte somente foi possível após operado o trânsito em julgado na demanda de origem. Vale dizer, o autor da ação rescisória, nesta hipótese, não teria obtido êxito em produzir a prova em questão quando pertinente por fato alheio a sua vontade, como bem pontua Fredie Didier. 

Nesse sentido é que se esclarece que, na realidade de tal circunstância, o que deve ser novo é o acesso da parte à prova ou a superveniente possibilidade de sua produção. Trata-se, certamente, de conjuntura fática cujo ônus probatório incumbe, novamente, à parte autora, que deve evidenciar nos autos a situação inicial de impedimento de produção ou acesso à prova e o respectivo acesso posterior.   

Portanto, a ação rescisória fundada no inciso VII do art. 966 do Código de Processo Civil deve contar, na realidade, com prova pré-existente, ou seja, evidência já anteriormente concebida a respeito de questão controvertida, mas cuja existência se ignorava ou cujo acesso não foi viabilizado quando pertinente.  

Tal como resumiu o Desembargador Federal Luiz de Lima Stefanini, do TRF 3ª Região, ao no julgamento da ação rescisória n° 5013439-70.2020.4.03.0000, em 08.03.2021: “Documento novo é, em realidade, “velho”: além de referir-se a fatos passados, sua produção também é pretérita.” O que é efetivamente novidade não é a prova, é a possibilidade de produzi-la, tolhida na lide originária por falta de acesso da parte ou desconhecimento. 

Não é demais relembrar que a parte incumbida de produzir de prova em Juízo deve fazê-lo em tempo e modo corretos, sob pena de preclusão. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça já entendeu que mesmo que a parte demandante, em sua petição inicial, tenha protestado genericamente por provas, o silêncio quanto ao despacho do julgador que determina que as partes especifiquem àquelas que efetivamente pretendem produzir, conduz à preclusão do direito à produção probatória, pois implica desistência do pedido genérico formulado na inicial. 

Nos mesmos moldes é que o art. 223 do Código de Processo Civil prevê que decorrido o prazo, extingue-se o direito de praticar ou de emendar o ato processual, independentemente de declaração judicial, ficando assegurado, porém, à parte provar que não o realizou por justa causa. Assim, o ajuizamento de ação rescisória fundada em prova nova exige do autor a demonstração de que não a apresentou anteriormente por fato alheio a sua vontade.  

Portanto, a despeito do que alguma leitura mais açodada do dispositivo possa acarretar, na realidade a prova não pode ser efetivamente nova, no sentido de que não pode ser produzida posteriormente ou em medida ulterior ao trânsito em julgado para justificar a pretensão rescindenda, exatamente a evitar a eternização de conflitos e lides postas a apreciação do Poder Judiciário.  

Do acórdão prolatado quando do julgamento da ação rescisória nº 5.196 – RJ (2013/0147106-7), em 27/03/2019, pelo Superior Tribunal de Justiça, é possível extrair relevantes parâmetros sobre o tema, vez que na ocasião o Ministro Mauro Campbell, relator do caso, destacou que a jurisprudência já estabeleceu que esse vício rescisório específico depende da prova do desconhecimento ou da impossibilidade de juntar essa nova prova na ação anteriormente julgada. Assim, asseverou que “a apresentação de nova prova é um vício rescisório quando, apesar de preexistente ao julgado, não foi juntada ao processo originário pelo interessado ou por desconhecimento ou por impossibilidade.” 

No julgamento em referência, a conclusão alcançada foi de que a alegação apresentada no caso concreto teria sido insuficiente para a explicar a razão pela qual a parte autora da ação rescisória não tinha conhecimento desse documento ou o porquê teria sido impedida de apresentar essa prova ainda na fase de conhecimento do processo original. O Ministro Benedito Gonçalves, na qualidade de revisor, frisou que a ação rescisória não pode se prestar a corrigir a desídia da parte autora no feito originário, salientando que a ação rescisória não pode ser utilizada como uma nova oportunidade para que as partes possam instruir adequadamente a lide. 

Destarte, além de não autorizar o ajuizamento de ação rescisória como espécie de recurso, a lei e a jurisprudência também não autorizam o ajuizamento da demanda específica como uma segunda chance de melhor exercer a sua pretensão em Juízo, incumbindo a quem alega o desconhecimento ou a impossibilidade de acesso à prova comprovar a sua alegação. 

Não há dúvida, portanto, de que a prova deve ser, efetivamente, preexistente, nos termos do que já demandava a jurisprudência mesmo sob a égide do Código de Processo Civil anterior (AgRg no REsp. 1407540/SE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 19.12.14). Contudo, é assente que não basta que seja qualquer prova nova. Sob a égide do Código de Processo Civil anterior, a jurisprudência era uníssona ao exigir que o documento novo fosse de tal relevância que bastasse, por si só, para assegurar a procedência do pronunciamento jurisdicional invocado.  

A jurisprudência dos tribunais, inclusive dos superiores, segue intacta nesse sentido, determinando que “o documento novo que propicia o manejo da ação rescisória, fundada no art. 966, VII do CPC, é aquele que, já existente à época da decisão rescindenda, era ignorado pelo autor ou do qual não pôde fazer uso, capaz de assegurar, por si só, a procedência do pronunciamento jurisdicional, o que não é o caso dos autos”. (AR 5.923/MS, Rel. Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/09/2018, DJe 17/10/2018). 

Com efeito, as restrições e limitações impostas guardam coerência com a sistemática processual constitucional, a preservar parâmetros valiosos como a coisa julgada, sendo despiciendo salientar que a alteração de decisão transitada em julgado deve mesmo ocorrer de modo excepcionalíssimo.  

Conquanto seja de rigor homenagear a relevância da segurança jurídica no cenário do Estado Democrático de Direito, fato é que o exercício da pretensão da revisão da coisa julgada baseada no art. 966, inciso VII, do Código de Processo Civil, impõe ao autor o rigoroso atendimento de diversas condições.   

Dentre as dificuldades impostas pela própria natureza da medida no caso concreto, é imprescindível ressaltar aquela conferida pela aplicação da regra relativa ao ônus da prova no curso da lide. 

É cediço que, nos termos do que prevê o art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil, incumbe ao autor o fato constitutivo de seu direito. Portanto, na hipótese, tratar-se-ia de ônus do qual deve se desincumbir o autor da ação rescisória quanto à impossibilidade de acesso ou desconhecimento da prova ao tempo da dilação probatória no trâmite do processo de que se extrai a decisão rescindenda.  

O diploma processual atualmente vigente prevê a possibilidade de dilação probatória nos autos da ação rescisória, dispondo expressamente o art. 972 que se os fatos alegados pelas partes dependerem de prova, o relator poderá delegar a competência ao órgão que proferiu a decisão rescindenda, fixando prazo de 1 (um) a 3 (três) meses para a devolução dos autos. 

Após a conclusão da instrução probatória na ação rescisória, o art. 973 determina a abertura de vista ao autor e ao réu para razões finais, sucessivamente, pelo prazo de 10 (dez) dias. 

A despeito de tal autorização normativa, não se nega a dificuldade, ou até a impossibilidade, de a parte se desincumbir do seu ônus de comprovar fato negativo, especialmente se situação for de desconhecimento da prova ou ainda a impossibilidade de acessá-la ou apresentá-la de maneira originariamente tempestiva.  

A prova de fato negativo é também conhecida como prova diabólica, consistente em modalidade de prova impossível ou excessivamente difícil de ser produzida pela parte. 

Nesse sentido, há relevante dificuldade em demonstrar que não se detinha ciência ou consciência acerca da prova, motivo pelo qual é de se relembrar que o regime geral de distribuição da carga e do ônus probatório não é absoluto, motivo pelo qual há abrandamento previsto pelo próprio legislador, sendo certo que, atualmente, o §1º do art. 373 do atual Código de Processo Civil estabelece que  

Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.  

 Contudo, conforme prevê o próprio dispositivo legal, trata-se de entendimento que fica a critério do julgador, inclusive porque a norma prevê que o juiz poderá atribuir o ônus da prova de modo diverso, não havendo qualquer obrigatoriedade de que assim o faça. 

Embora pareça claro que, em caso de flagrante dificuldade imposta a uma das partes por força da aplicação da regra geral de distribuição do ônus da prova deva o julgador coibir iniquidades de modo a se alcançar uma decisão democraticamente fundamentada, a jurisprudência revela que a alteração do encargo probatório se restringe, em sua maior parte, a aplicação do art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor.  

A despeito de o STJ já ter sedimentado posicionamento por meio da Súmula 7 no sentido de que não (re)avaliar fatos e provas, da jurisprudência do Superior Tribunal pode se extrair o entendimento acerca da prova de fato negativo: 

(…) 3. Isso porque, em se tratando de fato negativo (ou seja, circunstância que ainda não tinha ocorrido) a exigência da produção probatória consistiria, no caso em concreto, num formalismo excessivo e levaria à produção do que a doutrina e a jurisprudência denominam de “prova diabólica”, exigência que não é tolerada na ordem jurídica brasileira. Precedente: AgRg no AgRg no REsp 1187970/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/08/2010, DJe 16/08/2010. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. 

(…) É firme a orientação deste Tribunal Superior no sentido de que é inviável a exigência de prova de fato negativo. STJ – AgInt no AREsp: 1206818 SP 2017/0298612-0, Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Data de Julgamento: 24/04/2018, T3 – Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 02/05/2018 

Nessa linha de intelecção, resta concluir que o autor da ação rescisória fundada em prova nova deve, inicialmente, demonstrar que a desconhecia quando da dilação probatória na lide originária, fazendo-o por outros meios.  

Em geral, quando há o desconhecimento da prova apresentada a posteriori, a parte que a apresenta cuida de tratar das circunstâncias da descoberta da prova, que por configurarem fato positivo, em geral são parâmetros úteis para demonstrar o desconhecimento prévio.  

Vale frisar que a previsão do art. 966, VII, do CPC/15 não se refere à descoberta, pelo interessado, de fato novo, cuja existência desconhecia, não servindo de ferramenta para se reabrir o contraditório e questionar fato incontroverso no processo originário. 

Em relevante acórdão, o Superior Tribunal de Justiça abordou duas questões amplamente debatidas nos tribunais a respeito do tema: 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 966, INCISO VII, CPC/2015. PROVA NOVA. PROVA TESTEMUNHAL. CABIMENTO. DECADÊNCIA. ART. 975, § 2º, CPC/2015. AFASTAMENTO. TERMO INICIAL DIFERENCIADO. DATA DA DESCOBERTA DA PROVA. RETORNO DOS AUTOS. PROSSEGUIMENTO DO FEITO. NECESSIDADE.  

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).  

2. Recurso especial oriundo de ação rescisória, fundada no artigo 966, inciso VII, do Código de Processo Civil de 2015, na qual a autora noticia a descoberta de testemunhas novas, julgada extinta pelo Tribunal de origem em virtude do reconhecimento da decadência, por entender que testemunhas não se enquadram no conceito de “prova nova”.  

3. Cinge-se a controvérsia a definir se a prova testemunhal obtida em momento posterior ao trânsito em julgado da decisão rescindenda está incluída no conceito de “prova nova” a que se refere o artigo 966, inciso VII, do Código de Processo Civil de 2015, de modo a ser considerado, para fins de contagem do prazo decadencial, o termo inicial especial previsto no artigo 975, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015 (data da descoberta da prova nova).  

4. O Código de Processo Civil de 2015, com o nítido propósito de alargar o espectro de abrangência do cabimento da ação rescisória, passou a prever, no inciso VII do artigo 966, a possibilidade de desconstituição do julgado pela obtenção de “prova nova” em substituição à expressão “documento novo” disposta no mesmo inciso do artigo 485 do código revogado.  

5. No novo ordenamento jurídico processual, qualquer modalidade de prova, inclusive a testemunhal, é apta a amparar o pedido de desconstituição do julgado rescindendo. Doutrina.  

6. Nas ações rescisórias fundadas na obtenção de prova nova, o termo inicial do prazo decadencial é diferenciado, qual seja, a data da descoberta da prova nova, observado o prazo máximo de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.  

7. Recurso especial provido. 

(STJ – REsp: 1770123 SP 2018/0219451-6, Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Data de Julgamento: 26/03/2019, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/04/2019) 

A primeira questão relevante que se colhe do inteiro teor do julgado cuja ementa seguiu transcrita acima é de que, efetivamente, as circunstâncias da descoberta da prova são analisadas quando alegado o desconhecimento prévio, a deixar de esbarrar na impossibilidade que deriva da prova de fato negativo.  

A outra questão é justamente o prazo decadencial, que no caso da ação rescisória com base no dispositivo de lei aqui debatido é de 5 (cinco) anos. O prazo decadencial diferenciado está previsto expressamente no Código de Processo Civil: 

Art. 975. O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo. 

§ 1º Prorroga-se até o primeiro dia útil imediatamente subsequente o prazo a que se refere o caput, quando expirar durante férias forenses, recesso, feriados ou em dia em que não houver expediente forense. 

§ 2º Se fundada a ação no inciso VII do art. 966, o termo inicial do prazo será a data de descoberta da prova nova, observado o prazo máximo de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo. 

Em que pese a existência da previsão normativa, o citado acórdão do Recurso Especial n° 1770123 SP 2018/0219451-6, de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, foi bastante comentado, inclusive pelo relator, que ponderou que: “Essa é lei. O CPC/15 ampliou bastante. Não sei se a segurança jurídica está forte perante as novidades, mas atualmente, é a lei”. 

Aqui não se imagina esgotar o tema, detentor de muitos pontos de extenso debate há relevante período, mas destacar as dificuldades impostas no caso concreto quando o manejo da ação rescisória fundada em prova nova se fizer imprescindível ao jurisdicionado.  

Assim, o que se conclui é que o ajuizamento da ação rescisória com fundamento em prova nova demanda da parte autora, além da observância dos requisitos exigidos estabelecidos pela lei e pela jurisprudência à hipótese, a busca por um processo que permita que a parte exerça sua pretensão nos termos constitucionalmente garantidos, que evidentemente devem ser igualmente observados em demandas de natureza excepcional, especialmente no que toca à eventual dilação probatória necessária, já que autorizada por lei.      


Referências

DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. v. 3. 25ª edição. 2023, págs. 573-575 

MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Comentários ao Código de Processo Civil – Volume XV – 3ª Edição. 2021.  

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