Ao julgar apelação interposta por empresas da indústria alimentícia, o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará reconheceu que a mera desigualdade de porte econômico das partes não é capaz de caracterizar hipossuficiência justificar o afastamento da cláusula de eleição de foro.
O litígio gira em torno do pagamento de contrato celebrado entre a autora, uma empresa de produção de eventos, e uma das rés, uma agência de comunicação.
Realizado o evento e não efetuado o pagamento integral, a autora moveu ação de ressarcimento por enriquecimento sem causa em face de três empresas, quais sejam a contratante (primeira ré) e outras duas empresas do ramo de alimentos (segunda e terceira rés), que, na visão da autora, teriam se beneficiado do evento ao contar com a exposição de sua marca e produto.
Em contestação, a segunda e terceira rés arguiram preliminar de competência do juízo, tendo em vista a existência, no contrato, de cláusula de eleição de foro, além de trazerem impugnações específicas quanto ao mérito da demanda, notadamente a necessidade de demonstração da vantagem supostamente auferida pelas empresas, nos termos do art. 884 do Código Civil, e a impossibilidade de se presumir solidariedade, que, a teor do art. 265 do mesmo diploma, resulta da lei ou da vontade das partes.
A preliminar de incompetência em razão de cláusula de eleição de foro foi apreciada em audiência, tendo o magistrado entendido que, “no caso em comento, o autor se trata de uma empresa individual, com sede nesta Comarca, enquanto os demandados são empresas que fazem parte de um conglomerado internacional, evidenciando a hipossuficiência do autor em relação aos promovidos”. Por isso, rejeitou a exceção de incompetência, declarando ineficaz a cláusula de eleição de foro, aplicando o art. 63, §3º, do Código de Processo Civil.
O entendimento foi ratificado em sentença, que, no mérito, julgou procedente o pedido, condenando as rés ao pagamento do valor não adimplido do contrato.
Interposta apelação, a 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Ceará deu provimento ao recurso, cassando a sentença e reconhecendo a eficácia da cláusula de eleição de foro. Para tanto, registrou que, na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a cláusula de eleição de foro somente pode ser afastada quando, em contrato de adesão, se verificar abusividade consubstanciada na hipossuficiência e na inviabilização do acesso à justiça pelo aderente.
Em seu voto, o Relator destacou que o contrato em questão não era de adesão, afastando a legislação consumerista. Em seguida, enfrentou aspecto central da sentença, que havia utilizado a diferença de porte econômico das empresas envolvidas como fundamento para reconhecer a hipossuficiência da autora. Assim, concluiu que a “mera desigualdade do porte econômico das partes não é capaz de caracterizar a hipossuficiência econômica ensejadora do afastamento do dispositivo contratual”, arvorando-se em precedentes da própria Corte cearense.
Com isso, os autos serão remetidos ao foro eleito pelas partes para regular processamento e julgamento.